24 julho 2014

N° 41 – Garotas de Vidro (pra não dizer que não falei daqueles que me tiraram das cinzas)

"Deve-se ler pouco e reler muito. Há uns poucos livros totais, três ou quatro, que nos salvam ou que nos perdem. É preciso relê-los, sempre e sempre, com obtusa pertinácia. E, no entanto, o leitor se desgasta, se esvai, em milhares de livros mais áridos do que três desertos." NELSON RODRIGUES.


Não é a primeira vez que me encontro com a garota de vidro. Nem a segunda. Ler pouco, reler muito, isso funciona para mim. Descobri esse livro em um blog de moças como eu. Na verdade, eu estava mais interessada em dicas escondidas na literatura do que na própria literatura. Você sabe. Eles fazem todo o material para alertar, informar, cuidar, mas a gente também tem acesso. E você sabe como a gente usava aquilo.
O que mais me encanta nessa obra é a narrativa. O retrato perfeito que Laurie Halse faz da mente de Lia. O livro é real, próximo do leitor. A personagem vive em função de números, da tabela de calorias, da balança que mostra pesos falsos, da que mostra o verdadeiro. Os fantasmas a assustam, deixando sua mente cada vez mais confusa. Ela não tem noção da própria imagem, apenas almeja ser sempre menor.
Medo de engordar, busca pela perfeição, pressões, crises familiares atuais e passadas, brigas, a morte de sua melhor amiga, pai ausente, madrasta esgotada, mãe desesperada, ser exemplo para a meia irmã, escola, faculdade, decisões, psiquiatra, internações, exames, quarto de motel, caos total.
Assim, Lia ganha rosto, personalidade e o leitor mergulha na degradação de sua mente e corpo. Mas a autora não te fala essas coisas, ela te mostra. Ela tenta fazer você enxergar pelos olhos da anorexia. E como já senti na pele o que é ser uma garota de vidro, nem morta, nem viva, mas presa entre os dois mundos, só posso dizer que ela consegue.
Essa história mostra o poder de destruição de um distúrbio alimentar na vida de uma adolescente e sua família. Mostra as dores, as feridas que não secam, a necessidade de perdoar e ser perdoado. Mas também mostra a possibilidade de superação. O que a doença tentou tirar pode ser salvo com amor, paciência, força de vontade e uma equipe preparada.
Lia não morre, e aqui deixo meu spoiler. Mas isso não me impede de pensar em todas as outras garotas (e garotos) que já morreram ou estão morrendo. E por isso indico o livro. Para você que sofre com transtornos alimentares, direta ou indiretamente, ou para você que não dá muita importância ou nunca ouviu falar no assunto. Para que vocês saibam que há esperança, que há como dar a volta por cima. Eu consegui. E Lia também.
Corpo encontrado em quarto de motel, só. Não, Lia, não é legal quando as garotas morrem.

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